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não existe artista ruim

Palavras? Pra quê?

Não existe artista ruim ou bom, existe artista pouco treinado ou muito treinado. Não tem isso de talento nato, não tem essas de benção dos deuses, não existe gênio fora da natureza. O que existe são pessoas que treinaram muito e pessoas que treinaram pouco. Colocando desse jeito, até que fica simples.

Porque é simples.

Esta ideia pode ferir seu senso de divindade, concordo, mas isso é bom, isso é para o bem. Pois somos carne.

Nada de semideuses. Nada dessas coisas que a gente fala ou pra enganar todo mundo ou porque nunca pensou com seriedade sobre o assunto. Não. Chega de mentiras, chega de idolatria. Não existe o melhor por direito, mas sim o melhor que o é por merecer. Uma meritocracia técnica. Ganham os treinados.

E eu já sei que ninguém vai entender esse último parágrafo do jeito que eu gostaria que ele fosse entendido.

Artistas são suspeitos, porque usam a mais mortal técnica de manipulação de humanos para obter lucros, mas com um pequeno detalhe: ninguém, aparentemente, percebe que este é o único objetivo desses artistas, o lucro, pois eles passam uma falsa impressão de que estão ali apenas fazendo arte pela arte. É claro que as pessoas podem pensar que isso nem é tão nocivo assim. Claro, nossos artistas são apenas uma parte do problema, mas uma parte importante. Eles deixam a população cega, quando deveriam dar olhos à ela. Os artistas, assim como as religiões, conseguem arrancar com facilidade o dinheiro dos bolsos do cidadão comum, enriquecendo aos borbotões com a produção em série de lixo atômico disfarçado de arte. Que mal há nisso? Não sei, por que você não faz essa pergunta pra você mesmo quando estiver dentro dum ônibus lotado às três horas da tarde?

A arte, assim como o pseudoDeus, não precisa de nada. Quem precisa são os crápulas que usam seus nomes. Tomam emprestado suas ilusões, construídas por milênios com suas respectivas técnicas e métodos. Quem precisa do dinheiro, quem precisa das Coisas, olha elas aí de novo, as Coisas, que a gente coloca com letra maiúscula pra deixá-las importantes, quem precisa delas somos nós, minha gente.

As Coisas e nós.

Então devemos abrir os olhos para pastores e padres, políticos e cidadãos, artistas e empresários, arianos e reptilianos. Todo mundo. Numa linda e embalante paranoia geral.

E eu nem sei como vim parar aqui.

E quem sabe?

[CATO ALBERICO RIBEIRO]

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uma mentira que não espera quadrigêmeos

O ser humano é um bicho de mentira. Impressiona-me o fato de que, diante de histórias fantásticas, as pessoas nunca contam com o fato de que o tal contador de histórias fantásticas pode ser apenas um mentiroso. Pura e simplemente. Ele foi abduzido por aliens reptilianos do mal e não se tem nenhuma evidência disso além do testemunho do abduzido? Deve ser verdade, claro, ele não pode estar mentindo, afinal de contas é muito mais provável que uma forma de vida extraterrestre viaje milhões de anos luz para participar de sessões sadomasoquistas com humanos do que o abduzido estar mentido. Claro. Um papai transtornado joga a filha pela janela e nega que o fez apesar das inúmeras provas que mostram exatamente o contrário? Claro. Uma menininha chega grávida em casa e diz que foi o Espírito Santo? Claro.

Enfim, não quero me alongar nos exemplos “hipotéticos”; eles podem ser tendenciosos.

A imprensa, que também não é santa, mas é cega quando lhe convém, gosta de fechar os olhos para as mentiras mais escabrosas e ridículas e sempre nos presenteia com o supra sumo da bizarrice comportamental, todos os dias, no conforto dos nossos lares. O último “furo” mentiroso foi o da pedagoga Maria Verônica dos Santos, que se dizia grávida de quadrigêmeos, lá pras bandas de Taubaté, São Paulo. Ela andava por aí com uma barriga ridícula, que obviamente era de mentira, onde caberiam com facilidade os quatro supostos filhos além de mais alguns amiguinhos pré natais dos mesmos. Era simplesmente ridículo. E ninguém pediu nem mesmo uma averiguação, nem mesmo uma levantadinha no vestido.

O marido: imbecil ou cúmplice?

Está aí uma prova de como podemos ser inocentes e imbecis quando queremos. Mostramos esta estranha ingenuidade que só se justifica, penso eu, porque esperamos a mesma cegueira dos outros quando os mentirosos formos nós. Não consigo pensar em outra explicação. Não queremos enxergar essas mentiras, que às vezes podem ser hediondas, porque não gostamos de perceber que, às vezes, somos nós os mentirosos. Então fica tudo na boa. Você mente daí, eu minto daqui, e estamos combinados.

Agoras as pessoas ficam se perguntando: “pra que a menina inventa uma coisa dessas”? Eu, na verdade, fico impressionado mesmo com o fato de ter tanta gente que acredita. Mas isso sou eu.

Existe uma patologia, divertida, chamada “Síndrome de Munchausen”. Ela é uma desordem psiquiátrica em que os “doentes” simulam uma doença e fingem sintomas para conseguir a atenção das pessoas ao seu redor. Carência pura e um pouco exagerada. Existem mães, vítimas desse transtorno, que deixam seus filhos doentes, propositalmente, apenas para vestirem a capa da vítima e fingirem-se castigadas pelo destino. Elas sofrem e choram e pedem explicações aos médicos, mas são elas próprias que provocam os sintomas nos filhos, negando-lhes os tratamentos que os curariam com facilidade ou, não raro, piorando-os com envenenamentos periódicos ou súbitos enforcamentos.

Ah, a humanidade.

Este caso da pedagoga é bolinho.

Pedagoga mentirosa compulsiva, enfermeira arremessadora de cachorros, médico estuprador. Eu queria muito saber o que se passa com os diplomados desse Brasil.

Tá bom, o assunto não é esse.

Desculpem.

Mas eu falei alguma mentira?

[CATO ALBERICO RIBEIRO]

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a inveja, a publicação e a lógica fuzzy (partita #4 larghissimo com bravura)

Ser ou não ser publicado, eis a questão.

O que há de importante realmente em ser publicado? Ter editora? Essas coisas. Podemos fingir que é uma necessidade da literatura, já que, se não existissem livros publicados e editados, claro, no formato tradicional, ao alcance das mãos dos leitores, não haveria literatura nenhuma. E é verdade.

Mas ser contra a separação da literatura do livro, aí já são outras histórias. Ser contra o fim do livro, levantar bandeiras a favor de coisas, aí são coisas que não entendo.

Aí a gente volta ao tema destas zonas. As coisas.

A alienação é um fenômeno interessante. Feuerbach inventou o conceito, Marx e Engels poliram-no e finalizaram bem, mas desde então as pessoas fazem como se não tivéssemos decifrado este código comportamental. Quer dizer, nem mesmo a descoberta e a total compreensão deste fenômeno de psicologia em massa consegue tirar-nos deste pesadelo dogmático.

Somos golens, zumbis, mortos vivos, funcionando automaticamente, cegos enjoados que se surpreendem com as características mais fundamentais da consicência humana.

Somos pedras espantadas.

Pedras porque é como se não tivéssemos sentidos. E espantadas porque estamos espantados mesmo.

Ser publicado, acho, deve ser bom para construir aquela auto imagem enfeitada, aquele avatar carnavalesco que eu mostro para os outros, que eu uso para que o mundo de fora me reconheça como eu quero que eles me reconheçam. Deve ser bom pra autoestima.

Mas isto pode também ser facilmente confundido como um recalque da minha parte.

Uma inveja negra.

Eu tenho inveja dessas mentiras que nos cegam.

Queria ser como elas.

Tenho inveja desses avatares mal feitos de mim mesmo.

Editoras, meu nome está na lista telefônica.

[CATO ALBERICO RIBEIRO]

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pinocchio era um pedaço de carne que queria ser tábua ( partita #71 tempo rubato)

Se alguém disser que sabe o que está acontecendo, é mentira, sempre digo e repito e sublinho isso por aqui. Pode olhar fundo nos olhos dessa pessoa, apontar o dedo na sua cara, e dizer: você está mentindo. E a tal pessoa vai ter que assumir, ou botar o rabinho hipócrita dela no meio das pernas de carne covarde dela e ir embora, fingindo que sabe, fingindo que entende. Esses são os mentirosos da vida sem fim, são esses que colocam tudo a perder. Os mentirosos. E não estou falando do idiota que come a secretária depois do expediente do trabalho e diz à esposa que estava com os amigos no bar. E muito menos da criança que não sabe ler até uma certa idade e que diz pra todo mundo que sabe, de vergonha, medo da maldade e da perfídia alheia. Não, essas são mentiras belas. O problema do mundo é o povo que finge que entende alguma coisa. Qualquer coisa. Uma coisa. Uma coisa que seja.

E eu já disse que este é um livro sobre as coisas, não? Tá na capa, volta lá.

Desconfiem. Sempre. Afinal, não é por isso que estamos aqui nesta bateção de cabeças? Não é por isso que matamos e odiamos e choramos e sofremos? Porque somos de carne e o magnífico nela, na carne, é que ela sofre, sem entender porque, desconfiada. A carne desconfiada. Trata-se dessa perecível e mole condição humana.

Eu sei que temos livros e livros que nos dizem o que fazer. Estão aí todos os filósofos do mundo e dos tempos que não me deixam mentir. É muito filósofo. Muito amigo da onça da sabedoria. Olho para a estante e só os vejo. Vou à biblioteca e lá estão eles, atazanando-me, lembrando-me do tanto para ler, do tanto que não sei e do pouco que nunca saberei. Pego um livro para, como dizia o Leminski, me sentir menos bicho. Então leio, e eu juro que leio, mas quando acabo o livro, merda, eu me sinto mais bicho ainda. Mas, quando caminho, ao voltar para casa, ainda tonto de tanto “eu sei”, “eu entendo”, sinto-me mais bicho do que nunca, tudo estala, como sempre, mas logo tudo se acalma, pois percebo que nem sou tão bicho assim, nem tão tonto também, sou homem, sou carne, e sei que ninguém, na verdade, entendeu ou entende qualquer coisa de nada. Nem mesmo os tais filósofos. Nenhum deles entendeu nada mesmo.

E não serei eu, agora ou depois, que entenderei alguma coisa no final das contas.

[CATO ALBERICO RIBEIRO]

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a farsa (partita #15 grave, a piacere)

Entre um espaço de tempo e outro, nas horas livres que se estendem diante de mim, planejo planos maldosos e estou montando a maior farsa de todos os tempos. Em todos os tempos, entre um tempo e outro.

Manipular personagens reais, brincar com as vidas das pessoas, como um demiurgo louco que, diante do barro amorfo, pensando em bizarrices e fervendo com desejos teratogênicos, pensando no que aconteceria se tirasse uma perna aqui, um braço lá. Pensa nessas coisas, mas com muito prazer e aquele sorriso infame na boca. Sou o deus pirralho de meu mundo e todos estão aqui apenas para cuidarem de minhas estripulias irritantes.

Não preciso de tempo, pois tenho ele aqui comigo, cutucando cada segundo dos homens no meu bolso. Um tempo que não usa relógio, não se deixa levar por ponteiros indecentes e que não cabe em pulso nenhum. Meu tempo não cabe no meu relógio. Não preciso do tempo e sei que ele também não precisa de mim, por isso faço tudo que tenho pra fazer sem me preocupar com essas idiotices. Eu tenho todo o tempo do mundo e ele tem a mim.

Estou construindo uma babel farisaica, uma mentira que acredita nela mesma, que olha no olho das pessoas e dispara a falar falsidades com gosto de verdade, se bem que toda mentira tem que ter gosto de verdade, senão não seria mentira, seria mesmo uma verdade, enfim, se a gente começa a ir fundo na mentira, passa a acreditar que é verdade, e, indo pelo vice-versa das coisas, se tem gente que acredita demais na verdade, pode crer que em breve vai achar que a tal da verdade também inverteu seu sentido e virou mentira. Arre.

Eu minto: mentior: se estou falando a verdade, então o que falo é falso. Se é falso, então é verdadeiro. Coisas de grego antigo que não tinha mais nada pra fazer. Mileto devia realmente ser uma cidadezinha muito tediosa.

Então não tem muita diferença entre mentira e verdade mesmo, é isso?

Por que não me avisaram antes?

[CATO ALBERICO RIBEIRO]

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